Nunca as figuras dos sócios, diretores, gerentes e representantes de empresas, ou seja, de seus administradores, estiveram tão vulneráveis como nesses últimos tempos, especialmente no que diz respeito ao temível instituto jurídico do redirecionamento, a tais pessoas, de processos de execução fiscal originariamente de titularidade substancial de suas respectivas corporações, a teor de uma interpretação primária da própria literalidade do artigo 135, III do Código Tributário Nacional, em face de atos eventualmente praticados com excesso de poderes ou com infração de lei, de contrato social e de estatutos.
De
fato, por conta do precitado artigo e, de uma exacerbada sanha
arrecadatória estatal tributária, passaram aquelas figuras a sentir os
efeitos das sombrias expectativas das dívidas fiscais, então cobradas em
face das empresas sob suas gerências, serem redirecionadas, agora, às
suas próprias pessoas, com a peculiar agravante de que, em já constando
os seus nomes das respectivas certidões de dívida ativa das cobranças
executivas, passariam a deter a totalidade do intricado ônus probatório
quanto ao não cometimento (prova negativa) de qualquer ato pessoal
ilícito e doloso, nos termos daquele dispositivo legal, tal como
recentemente fora decidido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) -
REsp nº 1104900 e EDREsp nº 960456).
Devem ser aplicados os princípios do contraditório e da ampla defesa.
Por
sua vez, esse árido e espinhoso cenário empresarial, endossado que foi,
em parte, pela aludida tendência jurisprudencial encampada pelo
Superior Tribunal de Justiça, parece ter sido alvo de relevante avanço e
atualíssima reviravolta, sobremodo, em favor dos precitados e aflitos
administradores de empresas, cuja situação fora enfrentada e apreciada
sob os clamores, agora, principiológicos maiores de nossa presente Constituição Federal,
a teor do julgamento recém-proferido pelo Supremo Tribunal Federal
(STF), no Ag. Reg. no Recurso Extraordinário nº 608.426, Paraná (relator
ministro Joaquim Barbosa, 2º Turma, D.J. 04.10.11).
Com efeito, o
acórdão em questão, sob o contexto aqui discorrido, houve por bem
deixar expressamente consignado que "os princípios do contraditório e da
ampla defesa aplicam-se plenamente à constituição
do crédito tributário em detrimento de qualquer categoria de sujeito
passivo (contribuintes, responsáveis, substitutos, devedores solidários
etc.)".
Vale dizer, segundo proclamado pelo guardião máximo de
nosso texto maior, qualquer intenção atinente ao redirecionamento de
dívida fiscal às pessoas dos mencionados administradores, com base
naquele artigo 135, III do Código Tributário Nacional, haveria de trafegar em meio à defesa ampla e ao contraditório (artigo 5º, LV da Constituição Federal),
fazendo-se caminhar pari passu com a prévia existência de um processo
administrativo fiscal que também atraísse para si, além da empresa,
aquelas figuras, de sorte a restar comprovada, então, uma eventual e
inequívoca ocorrência material dos requisitos delineados no artigo 135, III do Código Tributário Nacional.
Somente
dessa forma, portanto, assim entendemos, estaríamos diante da
possibilidade de um efetivo controle administrativo de legalidade da
cobrança, inerente ao ato de inscrição das certidões de dívida ativa,
que pudesse bem justificar a presunção de liquidez e certeza que as
mesma possuem, ex vi dos artigos 2º, parágrafo 3º, e 3º da Lei nº 6.830, de 1980 (Lei de Execuções Fiscais) e 204 do Código Tributário Nacional.
Noutras
palavras, a presunção de liquidez e de certeza, inerente à certidão de
dívida ativa, também para os administradores das empresas primariamente
tributadas, há de pressupor, sempre, a ocorrência de um prévio controle
administrativo de legalidade, que deverá alcançar momento anterior,
portanto, à própria inscrição e que levará em conta, por consequência, o
momento que se estende do nascimento do crédito tributário ao de sua constituição final propriamente dita.
Ao
administrador, então, o que lhe é de direito, ou seja, um patrimônio
jurídico calcado na efetividade dos princípios constitucionais, em uma
nobre e justa homenagem, por fim, à própria segurança jurídica.
Walter
Alexandre Bussamara é especialista em direito processual tributário e
mestre em direito tributário pela PUC-SP, doutorando em direito
tributário pela PUC-SP e advogado em São Paulo
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